2º Artigo de Opinião 1ª Edição - Que retorno social se espera da Formação Universitária?

29-11-2012 16:43

 

“[…] os homens instruídos e com estudos, se, para começar, forem inteligentes e criativos, o que infelizmente, raramente acontece, tendem a deixar atrás deles memórias mais valiosas do que os homens simplesmente brilhantes e criativos. […] E, o que é mais importante, nove em cada dez vezes são mais humildes do que os pensadores sem estudos”. Jerome Salinger

 

 

 

Cada estudante duma universidade pública é financiado em cerca de 4000€/ano. A sociedade investe esse montante em cada aluno - “investe”, não “doa”. Investir pressupõe um retorno, um ganho.

Assim, no início deste ano lectivo, há uma questão que deve ser considerada: Que retorno espera a sociedade de cada estudante?
A disseminação do conhecimento e a facilidade de consulta de elementos de estudos, resultantes do desenvolvimento tecnológico, obrigam a repensar o papel do estudante universitário. De “marrão”, o estudante viu-se obrigado a ser um optimizador da informação disponível, de modo a possibilitar a resolução de problemas. Enquanto antes o objectivo era reter o máximo de informação e saber a sua aplicabilidade, agora passou a ser usar essa informação para intervir em situações “reais”, com criatividade e eficiência, interligando matérias de diferentes disciplinas. Ao estudante, hoje, é exigido um papel muito mais activo na aprendizagem, o que só é possível se houver uma consciencialização de que, na sociedade actual, “não basta saber”, é necessário saber “fazer”.

Concluindo, a sociedade exige que o estudante saia da universidade com capacidade de intervir na própria sociedade. Qualquer estudante que pretenda apenas “fazer as cadeiras”, não está a dar o devido retorno social. É, pois, um mau investimento.

Por outro lado, a Universidade, hoje, deixou de ter o monopólio do saber. Enquanto antes as universidades eram o centro da criação de conhecimento, hoje a sua contribuição é apenas parcelar. Actualmente são as empresas, com os centros de investigação, que assumem o protagonismo do desenvolvimento científico, e as universidades só se tornam, de novo, centros de saber, quando dialogam com a sociedade, com vista a contribuir para a resolução dos problemas “reais”.

No passado, sobre a questão “porque é que um jovem deve investir cerca de 6% do seu tempo de vida na universidade?” a resposta era clara: para adquirir conhecimento que dificilmente pode adquirir noutras circunstâncias. Actualmente, será que a resposta a esta questão continua assim tão clara? Que mais-valias pode dar a universidade na formação de cidadãos, numa sociedade em que o conhecimento está tão disseminado?

De facto, é na aquisição de competências que o papel da Universidade deve estar centrado, usando vias que facilitem a aquisição de conhecimento crítico, criativo e operativo, mas também na aquisição de qualidades cívicas e éticas, como o interesse por ser particularmente interveniente numa sociedade que investiu em si e a necessidade de ser um profissional de elevada qualidade. Este novo papel da Universidade exige que a formação humana dos estudantes passe a ser central, a par da formação académica.

Em suma, a sociedade investe, e exige que cada aluno queira ser o melhor estudante possível, adquirindo não só conhecimento “teórico”, mas operativo; desenvolvendo capacidade de trabalho e de resolução de problemas com criatividade; respeito por diferentes opiniões, optando por vias de diálogo; sentido crítico e processos de aprendizagem autónomos; mas também competências como responsabilidade, sentido de justiça social, confiabilidade (dada pela honestidade, integridade, cumprimento de palavra e lealdade*), respeito e desejo de continuar a aprender.

Destas competências emerge, naturalmente uma cidadania responsável, uma intervenção que permitirá à sociedade evoluir no sentido de responder cada vez melhor às necessidades individuais e colectivas, gerando bem-estar e qualidade de vida.

 

 

Dulce Esteves

Setembro 2009

 

 

*Josephson, M. (2002). Making Ethical Decisions. Ed. Josephson Institute of Ethics